O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 24 anos de idade no dia 13 de julho. Apesar de jovem, o conjunto de normas de proteção à infância amadureceu e passou por várias mudanças ao longo dos anos, gerando avanços significativos na proteção de crianças e adolescentes no País.
No entanto, se por um lado evoluímos na legislação, por outro, os poderes públicos deixam muito a desejar na transformação da lei em realidade.
Fundamental na proteção das crianças, o grande desafio do ECA é sua implementação efetiva, mesmo após mais de duas décadas de sua existência. “Há uma brutal diferença entre a Lei e a prática.
A prioridade absoluta ainda é uma ficção e a proteção integral é muitas vezes inexistente”, afirma o advogado Ariel de Castro Alves, presidente da Comissão de Infância e Juventude da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Bernardo do Campo, São Paulo.
Para Alves, é necessária uma maior atuação do Estado e de toda a sociedade, principalmente através da destinação de recursos que priorizem a área social e a cidadania.
Ações de erradicação do trabalho infantil, implementação de medidas socioeducativas e programas de oportunidades e inclusão para as famílias, além do atendimento às vítimas de abuso e exploração sexual, necessitam de verba para se concretizarem.
No atual cenário, explica o advogado, quem está irregular é a família, o Estado e toda a sociedade que não garantem o acesso aos direitos fundamentais e a proteção integral às crianças e aos adolescentes.
“Se o adolescente procura a escola, o serviço de atendimento para dependentes de drogas, trabalho ou a profissionalização e não encontra atendimento, ele pode acabar indo para o crime. O crime só inclui quando o Estado exclui.”
Outro ponto bastante comentado por especialistas é a precarização dos órgãos de proteção. De acordo com o advogado, pesquisas do próprio governo federal apontam que faltam 632 conselhos tutelares no país e os que existem não contam, na maioria das situações, com a mínima infraestrutura de trabalho.
“O próprio Poder Judiciário não tem estrutura adequada, já que muitas vezes os juízes acumulam funções e não contam com uma equipe de técnicos para auxiliar os magistrados.
Então, como ele vai ter condições de cobrar as prefeituras, estados e instituições, se o próprio Judiciário mesmo não cumpre a legislação e não prioriza a proteção à infância?”
Ontem e hoje
A promulgação do ECA, em 1990, substituiu o ultrapassado “Código do Menor”, que vigorou por mais de sete décadas no país, e trouxe novos olhares em relação à criança e ao adolescente.
“A criança de rua, negligenciada educacionalmente, explorada sexualmente, que está trabalhando, infratora ou vítima de tortura era vista como em ‘situação irregular’ e deveria ser ‘objeto’ de intervenção dos adultos e do Estado, já que não eram considerados ‘sujeitos de direitos’”, explica Alves.
Desde sua promulgação, o Estatuto passou por importantes mudanças. Como, por exemplo, a Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), em vigor desde 2012 e que estabelece que as medidas aplicadas aos adolescentes envolvidos em atos infracionais devem ser individualizadas e que os jovens tenham acesso à educação e capacitação profissional, entre outros itens.
Mais recentemente, em fevereiro de 2014 uma alteração garantiu prioridade na adoção de crianças e adolescentes com deficiência e doenças crônicas. Em abril, uma modificação buscou assegurar a convivência da criança com o pai ou mãe encarcerado.
E por último, a Lei Menino Bernardo trouxe ao ECA a proibição do castigo e da violência física como forma de educar os filhos. Conhecida como Lei da Palmada, foi sancionada em junho depois de quase dois anos parada no Congresso Nacional.
Ainda com os avanços da lei, os números da violência atestam a falta de proteção às crianças. “Meninos e meninas do Brasil todo estão à mercê da violência, crueldade e opressão.
O recente caso da morte do Menino Bernardo Boldrini, no Rio Grande do Sul, expôs a precariedade do Sistema de Proteção de Crianças e Adolescentes no Brasil”, aponta Alves.
Além das dificuldades na implementação do ECA, há ainda diversos outros projetos de lei que ameaçam os direitos das crianças e dos adolescentes. Entre eles está a redução da idade mínima para o trabalho e a redução da maioridade penal.
“Atualmente, o desenvolvimento econômico, social e as oportunidades de empregos não estão chegando aos jovens de 14 a 21 anos, com defasagem escolar, vulnerabilidade ou em conflito com a lei.
Ou seja, reduzir a idade penal seria a decretação da completa falência dos sistemas educacionais e de proteção social do país”, reflete Alves.(www.promenino.org.br)
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